Por que a pecuária brasileira vem tomando espaço da norte-americana?

Por Maurício Palma Nogueira, engenheiro agrônomo, diretor da Athenagro e coordenador do Rally da Pecuária.

Recentemente, circulou um texto em inglês sobre a pecuária brasileira. O autor elencou vários fatores que explicariam o grande avanço da competitividade do Brasil nesse setor. Embora o texto trouxesse muitas informações embasadas, havia alguns pontos equivocados merecendo algum esclarecimento.

Influenciado por desinformações difundidas pela agressiva agenda do radicalismo ambiental, o autor coloca um dos pontos que explicaria o sucesso do Brasil: o avanço da pecuária sobre fronteiras. O texto também sugere forte apoio governamental através de subsídios, investimentos dos chineses e árabes na pecuária brasileira e  a legislação ambiental mais flexível.

Por solicitação de outros leitores, escrevi alguns pontos que foram muito bem recebidos pelo autor. A conversa manteve-se civilizada, focada em argumentos e posições embasadas, algo raro de ser ver hoje em dia nas redes sociais.

A seguir o texto com os meus esclarecimentos na íntegra. 

“Concordo com grande parte do que está escrito na postagem, salvo algumas considerações.

O apoio governamental no Brasil está superestimado. O mérito é todo da iniciativa privada. Muitos confundem o total de recursos disponibilizados pela política agrícola com subsídios do governo, como se o dinheiro não tivesse que ser devolvido. O único subsídio real disponível ao agronegócio é a diferença entre os juros dos planos agrícolas e os juros da economia (subvenção da tarifa agrícola).

Só as condições logísticas e a ausência de burocracias similares para a produção nos EUA compensam qualquer auxílio que possa ser destinado por parte do governo. Em resumo, no Brasil, o governo pesa mais do que ajuda.

Outro equívoco está em relação aos investimentos externos na pecuária. No entanto, os investimentos de oriundos da China e do Oriente Médio favoreceram algumas empresas em seus ramos de negócios: insumos, frigoríficos, revendas etc. Não há correlação entre os investimentos externos e o aumento da competitividade do setor no Brasil.

Também não tem sentido dizer que a pecuária brasileira cresceu em um ambiente com menos restrições ambientais. Além de termos o código florestal mais rigoroso do mundo, o setor é altamente pressionado por impactos que não são causados pela produção de carne.

Provavelmente, o autor associou o avanço da produção com o desmatamento. Está errado.

Os desmatamentos ilegais, ou não autorizados, ocorrem basicamente em duas frentes:

– Dificuldade de controlar os inúmeros avanços de pequenos produtores que, quando somados, geram uma área considerável.

– Operadores ilegais com o objetivo de capitalizar em cima da operação imobiliária, avançando sobre terras que não deveriam ser abertas.

Controlar o desmatamento depende de regularização fundiária, implementação completa do código florestal e combate à corrupção e ao crime organizado. 

O avanço ilegal sobre o território atrasa a competitividade da pecuária por movimentar o mercado sonegado, prejudicando os produtores que obtêm resultados de forma idônea.

E mesmo nesse cenário adverso, a pecuária brasileira soma algumas conquistas nos últimos 35 anos. Entre o início da década de 1990 e a média dos últimos quatro anos (2021 a 2024) registramos:

– Acréscimo de 140% na produção de carne, com aumento de 29% no rebanho.

– Aumento de 808% nas exportações

– Redução de 15% na área de pastagens,

– Produtividade média cresceu 184% no período. 

A análise sobre a importação de carne mais barata, oriunda do Brasil, desconsidera um ponto essencial nas operações da indústria norte-americana.  

Os EUA exportaram 1,34 milhão de toneladas de equivalentes carcaças em 2024, enquanto importaram 1,99 milhão de toneladas de equivalentes carcaças. O preço de exportação da carne norte-americana é consideravelmente maior do que o preço de importação da carne brasileira. Grande parte dessa operação, portanto, agrega valor à pecuária norte-americana, não o contrário.

Em US$/@, o preço atual pago aos pecuaristas do Estados Unidos é US$123/@, enquanto na média Brasil está em US$53/@, menos da metade.”

A construção da competitividade da pecuária brasileira está alicerçada na ciência agronômica e zootécnica tropical e, principalmente, no dinamismo do empresariado brasileiro.  Ao longo das últimas três décadas e meia, o país vem mostrando ao mundo que é possível produzir preservando as florestas e melhorando as condições físico-químicas do solo, o que inclui a biota presente na área.

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