O jornal “Il Sole 24 ore”, principal veículo formador de opinião sobre temas econômico-financeiros na Itália, publicou, hoje (26 de agosto), minha carta em resposta à matéria “Amazônia: Aumenta o Desmatamento com os Incêndios em Julho”, veiculada no último dia 20 de agosto, em que se associava diretamente a agricultura do País ao desmatamento.
A íntegra da carta-resposta foi publicada, em destaque, na primeira página da sessão “Mundo” do referido jornal, em versão impressa, com o título “Veja Por que é Errado Vincular Agricultura e Desmatamento no Brasil”.
Entre os argumentos que utilizo na carta, ressalto: o erro de atribuir à Amazônia a alcunha de “pulmão do Mundo”; dados que revelam o compromisso histórico do Brasil com a conservação ambiental; o pioneiro investimento da agricultura brasileira em pesquisa, gerando um “efeito poupa-terra” e que é responsável pelo seu êxito; números que revelam a diminuição da área de pastagem ao mesmo tempo que aumenta a produtividade da agropecuária brasileira; o comprometimento do setor privado brasileiro com a qualidade e sustentabilidade de produtos, consentindo seu acesso a mercados exigentes, sem ajuda de subsídios como ocorre na Europa; a importância do pilar social da sustentabilidade, uma vez que a agricultura gera emprego e renda; e a concorrência desleal baseada na pela desinformação, em prol de interesses protecionistas e em prejuízo dos cidadãos.
Transcrevo, a seguir, o conteúdo de minha carta-resposta – em versão reduzida em relação à missiva previamente dirigida ao “Il Sole 24 Ore”, dadas as limitações de espaço para publicação no referido jornal:
“Veja Por que é Errado Vincular Agricultura e Desmatamento no Brasil“.
“Tendo lido o artigo “Amazônia: Aumenta o Desmatamento com os Incêndios em Julho”, sinto-me na obrigação de, em um espaço democrático, transmitir informações sobre a realidade agroambiental do Brasil, contribuindo com o debate.
Em primeiro lugar, é importante esclarecer que o `pulmão do mundo` são os oceanos, e não as florestas tropicais. A Amazônia absorve a maior parte do oxigênio por ela produzido, por meio da fotossíntese, como corroborado por pesquisadores do “Laboratório de Ciências do Clima e do Meio Ambiente” e outros institutos científicos. Portanto, referir-se à Amazônia como “pulmão do mundo”, ainda que atualmente a utilização desse termo se tenha tornado um clichê pobre, não demostra, por isso mesmo, conhecimento do Brasil e pré-anuncia um texto tendencioso, no qual a realidade agroambiental brasileira será abordada por intermédio de lugares comuns, frequentemente acompanhados de um tom pseudo paternalista.
A Amazônia é a maior floresta equatorial do mundo.
Trata-se de um feito dos brasileiros, que a conservam até os dias de hoje, fazendo-o melhor do que vários países do Norte do mundo, onde florestas naturais já não mais existem.
Mais de 60% do território brasileiro é coberto por vegetações nativas, com atividades agropecuárias limitadas a cerca de 30% do território, sendo 8% para toda a atividade agrícola no país e aproximadamente 22% para a pecuária. O Brasil, como potência agroambiental, é consciente de suas responsabilidades e vem adotando várias medidas para contrastar o desmatamento, sendo exemplos a Operação Verde Brasil; o Programa ABC Cerrado; e o Plano de Investimentos para Agricultura Sustentável, além de outras iniciativas, das quais infelizmente pouco se fala.
O artigo supracitado apresenta visão distorcida da realidade brasileira, sem oferecer ao leitor contrapontos. Não menciona, por exemplo, que, de acordo com a `Global Forest Resourcement Assessment`, a redução pela metade da desflorestação na América do Sul é atribuída ao quadro brasileiro, onde a perda florestal caiu de 3,95 milhões de hectares no período 2000-2010 para 1,5 milhão de hectares em 2010-2020.
O Brasil liderou também o crescimento de áreas de florestas plantadas na região sul-americana e tem o maior estoque global de florestas em crescimento, equivalente a 22% do total.
Mais especificamente, na agricultura, em um período de 29 anos, de 1990 a 2019, o Brasil diminuiu a área de pastos dedicada à criação de animais em 15,5%, enquanto a produtividade cresceu 169%.
A produtividade por hectare/ano da produção brasileira de carne passou de 1,6@/ha/ano em 1990 para 4,3@/ha/ano em 2019, graças a um pioneiro investimento em pesquisa. Com esse aumento de produtividade, que resultou em um efeito “poupa-terra”, os produtores brasileiros de carne evitaram que cerca de 270 milhões de hectares fossem desmatados.
Estima-se, segundo a Athenagro Consultoria, que até 2027 a produtividade da criação de gado aumentará 47%, liberando cerca de 10 milhões de hectares.
Portanto, vincular a agropecuária brasileira ao desmatamento e a incêndios sazonais não mostra conhecimento do Brasil e termina por prejudicar, por meio de concorrência desleal, os produtores brasileiros que se empenham em prol da sustentabilidade e tantas famílias cuja renda depende da agropecuária. Não se deve perder de vista que, de acordo com a FAO, a criação de gado apoia a manutenção da renda de 1,3 bilhão de pessoas no mundo, promovendo também a sustentabilidade em seu pilar social (frequente e deliberadamente ignorado por muitos observadores estrangeiros).
É relevante recordar que os exportadores brasileiros são certificados e suas atividades monitoradas pelos próprios importadores, motivo pelo qual não é correto associá-los, com base em dados não comprováveis, ao desmatamento. O Brasil e seu setor privado investem na sustentabilidade e na qualidade, o que permite seu acesso aos mais exigentes mercados, sem apoio de grandes subsídios, como ocorre na Europa.
Infelizmente, há grande interesse de concorrentes internacionais do agronegócio brasileiro de divulgar uma imagem negativa da produção agrícola no País.
A desinformação é instrumentalizada pelos “soberanistas alimentares”, que querem vender em outros mercados, mas não querem submeter-se à concorrência de produtos de igual ou superior qualidade e sustentabilidade, em detrimento sempre dos cidadãos.
Ao agradecer o interesse na agricultura brasileira, reafirmo minha disponibilidade para fornecer informações precisas sobre a agricultura ‘Made in Brazil’ “.
A carta-resposta publicada no “Il Sole 24 Ore” foi divulgada também em redes sociais do Posto.
Autor: Helio Vitor Ramos Filho, Embaixador
Fonte da Notícia
Ambasciata del Brasile a Roma