Com o crescimento da competitividade de atividades concorrentes e menor disponibilidade de terras, a pecuária brasileira passa por um momento de quebra de paradigmas. Por um lado, sua produção de carne crescerá na próxima década a ponto de se tornar a maior do mundo, o que é basicamente um atestado de sucesso para o setor. No entanto, este sucesso da pecuária não significa, necessariamente, sucesso para todos os pecuaristas. Este foi o alerta que o agrônomo, escritor, consultor econômico e palestrante Ivan Wedekin fez aos produtores em entrevista concedida ao Giro do Boi desta terça, 24.
Segundo Wedekin, a pecuária brasileira é a única cujo rebanho tem crescido ano após ano. Entretanto, nas próximas temporadas será necessária uma diminuição no número de cabeças para que a pecuária de corte seja mais intensiva e eficiente. “É preciso que se ganhe em escala porque nos últimos anos a pecuária cresceu pouco”, disse o consultor, fazendo contraponto ao aumento do rebanho.
Wedekin, a exemplo do que recomendou o agrônomo Wagner Pires em entrevista exibida nesta segunda, 23, ao Giro do Boi, pediu que o pecuarista “carinhosamente” transforme a pecuária em um ramo da agricultura. “Pasto tem que ser tratado igual lavoura, pois assim como o milho, o capim é uma gramínea, e na agricultura o produtor coloca muita tecnologia”, contrastou. Para o consultor, esta virada de chave dependerá da integração de sistemas dentro da porteira, visto que a implementação da ILP traz consigo uma natural adoção de tecnologias.
O agrônomo frisou que é essencial diminuir a tolerância da atividade a médias baixas de produtividade. Wedekin afirma em suas palestras que “a pecuária é muito tolerante à convivência de sistemas produtivos com elevados desníveis de produtividade“, fato que não ocorre em atividades como a avicultura, suinocultura ou mesmo a agricultura.
Com dados do Rally da Pecuária 2017, Ivan lembra que a média de produtividade dos pecuaristas de cria gira em torno de 5,1 arrobas por hectare ao ano, enquanto produtores mais sofisticados produzem acima das 20 @/ha/ano. “Alguns confinamentos chegam a até 70 arrobas por hectare ao ano”, destacou. “Este desnível de tecnologia por um lado é um problema para a pecuária. Mas por outro, é uma oportunidade, porque poucos setores da economia brasileira têm possibilidade de melhorar tanto”, ponderou.
De acordo como Wedekin, este produtor que produz 5 @/ha/ano equivale ao agricultor que produz hoje 60 a 70 sacas de milho por hectare no estado de São Paulo. “Esse produtor não tem chance de sobreviver, assim como o pecuarista que está fazendo 5 @/ha/ano vai ser cada vez mais pressionado no futuro. Ele tem capital mobilizado na terra, no rebanho, e não vai conseguir girar a contento porque não tem a tecnologia essencial. Mas nosso problema significa maior oportunidade. O produtor tem que investir em tecnologia, melhorar o rebanho, a nutrição, a sanidade e, especialmente, tratar o pasto como uma lavoura”, pediu o agrônomo.
Um dos entraves para a mudança de visão do setor passa pela visão patrimonial que boa parte dos pecuaristas tem de seu negócio. “O que a experiência mostra é que a salvação é a incorporação de tecnologia na gestão do negócio. O pecuarista tem um drama no travesseiro. A sua atividade mobiliza intensivamente capital. É a terra, é a sua fazenda, é o rebanho, que está caro. Então se aloca muito capital, aí fica difícil girar isto para que a atividade seja rentável. Por isso a intensificação é o futuro. O pecuarista precisa tomar a decisão: continuar com 100% do capital na terra, no rebanho, ou reduzir a área e melhorar a tecnologia nos 80% que sobraram”, esclareceu Wedekin.
QUANTIDADE E QUALIDADE
Wedekin atenta para outro ponto essencial para a evolução da pecuária de corte brasileira: a aliança entre a produção de qualidade e quantidade. “Precisamos aliar. Os bois do farol verde, com boa cobertura de gordura na carcaça, atenderão segmentos cada vez mais exigentes, que pagam mais pela tonelada de carne bovina. O Brasil é o primeiro em volume de exportação, mas perde feio para a Austrália em faturamento. Mas temos uma vantagem, que é o nosso mercado interno de 208 milhões de habitantes, uma população que quer comer carne bovina. Precisamos ter eficiência para aumentar a produção e ter mais quantidade, mas em paralelo subir a régua da qualidade, conseguir faturar e remunerar melhor o produtor, desde que ele faça seu dever de casa”, analisou.
“Com certeza o Brasil será o maior produtor mundial de carne bovina. Escrevam e me cobrem daqui a dez anos”, desafiou Wedekin.
Assista à sua entrevista na íntegra ao Giro do Boi desta terça, 24, clicando no vídeo abaixo:
http://www.girodoboi.com.br/destaques/maior-produtor-mundial-de-carne-bovina-brasil-dez-anos/