Recém-encerrado, o primeiro trimestre deu uma mostra das dificuldades que os frigoríficos brasileiros devem enfrentar ao longo do ano. No menor nível desde 2001, o consumo per capita de carne bovina no Brasil continua a se deteriorar, tornando a válvula de escape das exportações ainda mais importantes. Neste momento, apenas os frigoríficos exportadores têm algum motivo a comemorar.
“Só se salva quem exporta”, afirma o analista da consultoria MB Agro, César Castro Alves, em alusão às dificuldades enfrentadas pelos frigoríficos de carne bovina. De acordo com cálculos feitos pela consultoria a partir de dados do IBGE e da Secretaria de Comércio Exterior (Secex), cada brasileiro consumiu, em média, 30,6 quilos de carne bovina em 2015, retração de 8,4% na comparação com o ano anterior.
Resultado da combinação entre a menor oferta de boi – que fez os preços da carne dispararem – e da crise econômica, a abrupta queda levou o consumo per capita ao menor patamar em 14 anos (ver gráfico), voltando aos níveis vistos no fim do século XX. Em contrapartida, as concorrentes carnes de frango e suína ocuparam o espaço da proteína bovina, atingindo o maior consumo per capita desde 1997 – 44,4 quilos e 14,8 quilos, respectivamente, de acordo com a MBAgro.
Mas o problemas da indústria de carne bovina não se resumem à fraca demanda no Brasil. Segundo Alves, o setor é bastante atingido pelo crédito escasso e mais caro. Dependente das compras de boi para abate, esse setor é intensivo em capital de giro.
Não bastasse isso, os preços do boi gordo, responsáveis por cerca de 80% dos custos de produção da indústria de carne bovina, não deram alívio. No primeiro trimestre, o preço médio do boi gordo no Estado de São Paulo foi de R$ 153,18 por arroba, alta de 6,3% na comparação com a média do mesmo período passado, conforme o indicador Esalq/BM&FBovespa. Em 2015 como um todo, o preço médio do boi gordo já havia subido 15,1%.
Nesse cenário, a margem bruta dos frigoríficos de carne bovina no mercado interno recuou de 17,3% em dezembro para 9,4% em março, de acordo com levantamento feito pela Agroconsult.
Foi justamente nesse contexto que a JBS, que lidera a produção brasileira de carne bovina, deu férias coletivas de 20 dias para os funcionários de quatro frigoríficos no Brasil, para reduzir o estoque de carne e também se ajustar à oferta de boi gordo. O período de paralisação das quatro plantas foi concluído, e as unidades estão operando novamente, afirmou na semana passada o presidente da divisão de carne da JBS no país, Renato Costa.
Entre as três empresas de carne bovina listadas na BM&FBovespa, a JBS é a mais dependente do mercado brasileiro de carne bovina – 60% da produção da divisão JBS Mercosul é comercializada no mercado brasileiro. A Minerva é a menos impactada, por gerar 70% das receitas na exportação. Segunda maior produtora de carne bovina do Brasil, a Marfrig exporta em torno de 50% de sua produção no Brasil.
Nesse contexto, o executivo da JBS reforçou na semana passada o foco nas exportações para equilibrar as margens das operações de bovinos no Brasil, uma vez que a recuperação do consumo do produto só ocorrerá com a retomada da economia, o que não parece estar no horizonte.
De fato, exportar tem compensado mais do que vender carne bovina no mercado brasileiro, afirma Alves. Conforme a MB Agro, o preço da carne bovina vendida no exterior foi 20% maior, em real, que o preço da carne comercializada no mercado interno em fevereiro. Os cálculos referentes ao mês de março ainda não estão disponíveis. Além disso, a demanda também se mostra aquecida, puxada por China. Entre janeiro e março, as exportações aumentaram 23%, em volume, de acordo com dados da Secex.
Mas exportar não é uma possibilidade para todos. Enquanto os três maiores frigoríficos do país concentram ao menos 80% das exportações de carne bovina, apenas cerca de 20% da produção nacional é exportada. Ou seja, a produção restante fica exposta ao cenário turbulento da economia brasileira, que levou não só a uma redução do volume de carne bovina vendida no país, mas também à queda de preços, afirmou uma fonte que acompanha de perto o setor frigorífico.
Para as companhias que estão fora do jogo das exportações de carne bovina, o cenário é bastante adverso. Apesar de ser mais rentável, exportar exige mais capital de giro e, portanto, mais crédito. Também há uma dificuldade operacional, já que o processo de licenciamento para habilitar um frigorífico para a exportação é bem rígido.
Fonte da Notícia
Valor Econômico