Pela primeira vez, desde que a vida surgiu no planeta há cerca de 3,5 bilhões de anos, uma das inúmeras espécies que já se desenvolveu por aqui tem potencial para provocar uma extinção em massa. Todos os demais eventos que levaram diversas espécies simultaneamente à extinção ocorreram por causas naturais, sejam de origem interna ou externa ao planeta.
Não se trata de exagero e nem de catastrofismo, mas sim da constatação do poder destrutivo que a tecnologia pode criar, como é o exemplo da manipulação do átomo e seu dano potencial, seja ele proposital ou acidental.
A consciência dessa responsabilidade sobre o próprio futuro gera o desconforto e a preocupação global que vivemos atualmente. O debate é intenso porque faz parte da natureza do homem buscar soluções para os problemas que surgem.
No entanto, se o tema sustentabilidade fosse conduzido de forma cordial, inclusivo e verdadeiramente embasado em ciência, diversos problemas já teriam sido resolvidos ou, no pior dos casos, as soluções estariam bem avançadas.
Um dos exemplos é o controle do desmatamento ilegal no Brasil, cuja solução planejada há quase uma década ainda não foi implementada. E por incrível que pareça, os responsáveis pelo atraso na implementação são justamente os que se apresentam de forma mais explícita contra o desmatamento.
Por melhor e mais justo que seja o sistema para conviver em sociedade, a democracia não agrada os que discordam da opção da maioria. Ao invés de aceitar e se adaptar ao desejo dos demais, os mais extremistas fazem de tudo para que a sua própria vontade – a de uma minoria – seja imposta.
Pacificamente, a única maneira de atingir seus objetivos é pelo convencimento. É aí que a informação e a comunicação ganham importância. O assunto sustentabilidade acaba se transformando em oportunidade para que bandeiras, empunhadas há décadas, sejam inseridas como solução de parte dos problemas. Um dos exemplos mais conhecidos é a campanha quase que religiosa para combater o consumo de carne.
Não se trata de uma conspiração, ou algo orquestrado e tramado de forma a convencer uma legião de incautos. Trata-se apenas do perigosíssimo encontro entre preconceito e desinformação.
Aqueles que combatem o consumo de carne realmente acreditam que seja essa a natureza do problema. A crença deles é um direito conquistado pela sociedade moderna, e deve ser garantido. Mas para provar que estão certos precisam seguir o caminho do método científico, o que possibilitou à humanidade chegar onde chegou.
Com a atual velocidade de troca de conteúdo, possibilitada pelas redes sociais e por modernos dispositivos de comunicação, é impossível administrar a quantidade de informações geradas diariamente, mesmo pelas mais geniais dentre todas as cabeças humanas.
A cada dia, novas publicações são divulgadas de forma desorganizada, misturando dados científicos com hipóteses, estimativas, suposições e conclusões que muitas vezes não conversam com os estudos nos quais dizem estar embasados.
E pior. Nesse ambiente, pesquisadores contribuem com a confusão ao divulgar estudos mal elaborados que alimentam a onda do sensacionalismo, superestimando eventuais impactos negativos da pecuária. Seja no erro do dimensionamento das emissões de gases do efeito estufa ou na falha em reconhecer avanços técnicos e projetar impactos futuros na produção de carne, o fato é que muitos estudos científicos estão deixando a desejar em uma das etapas mais importantes para a elaboração de pesquisas. A revisão bibliográfica é hoje ainda mais essencial, dado o extenso portfólio de conhecimento disponível sobre os diversos temas. Não dá para negligenciar essa etapa.
Considerando a seriedade e o histórico curricular dos pesquisadores que geralmente se envolvem em trabalhos incompletos e falhos, a única explicação plausível para essa falha é a relutância em incluir especialistas em produção animal e em economia no planejamento, elaboração e análise dos estudos. Infelizmente, a vaidade é ainda muito presente entre os pesquisadores. Prova disso é que passou a ser frequente o surgimento de expressões curiosas como “melhor ciência”, “boa ciência”, além do embasadíssimo argumento que entrou na moda no debate científico: taxar de negacionistas todos aqueles que questionam a forma de condução do estudo. A ciência prevê a demonstração e não o convencimento por carteiradas curriculares.
O oportunismo também pegou carona. Empresários e pesquisadores, extremamente hábeis e empreendedores, desenvolveram produtos elaborados a partir de vegetais que imitam o sabor da carne.
Outros usam conhecimentos e protocolos laboratoriais para multiplicar células para produzir carne a partir de um animal que continuará vivo. Ambos são exemplos da criatividade e capacidade humana para criar produtos inovadores que poderão atender demandas geradas desde a simples escolha, pela opção da dieta, até para melhorar a qualidade de vida de alérgicos ou garantir maior conforto para as longas aventuras espaciais previstas para as próximas décadas.
O problema de ambos os produtos está na comunicação. Erram grosseiramente ao se aproveitarem da desinformação e do medo legítimo das pessoas em relação ao futuro do planeta. Se não usassem mentiras para viabilizar seus produtos, é bem provável que a relação entre as marcas e os investidores fosse construída em bases mais sólidas e duradouras. O futuro nos dirá, mas valeria a pena explicar a tais empreendedores o conceito da Lei de Liebig, ou dos mínimos.
Para os usuários das informações, o ambiente ficou complicado. Como digerir, debater e transformar em ações tudo que é divulgado? É preciso tempo, revisão de todo o conhecimento acumulado, experiência na discussão, repetição dos resultados, enfim, tudo que é previsto pelo método científico.
Aí sim tem início a ação de oportunistas simplesmente em busca do que o homem sempre buscou ao longo de toda sua história: riquezas e projeção política; poder.
A desinformação passa a ser uma arma de convencimento. E uma rápida análise cuidadosa e objetiva sobre a divulgação de estudos e entrevistas tornará evidente o objetivo por trás de tudo isso. Trata-se de um show midiático.
E muitas vezes as conclusões são requentadas, divulgadas por diferentes organizações com base nos mesmos dados mal gerados e mal interpretados. Um dos exemplos atuais são os estudos tentando relacionar o desmatamento com as exportações através das guias de trânsito animal para identificar os impactos dos fornecedores indiretos. É impossível estabelecer essa relação de forma honesta e justa sem o controle individual dos animais.
Temos aí a receita para colocar tudo a perder. Ameaça real, medo, preconceito, desinformação e oportunismo são hoje os principais problemas que precisaremos enfrentar para construir um mundo verdadeiramente sustentável.
Para solucionar qualquer problema é preciso analisá-lo de forma técnica, inclusiva e aberta a sugestões e críticas. Esse é o maior desafio contemporâneo que precisará ser superado nos próximos anos. Construir um debate inclusivo, despido de preconceitos e interesses, para garantir o desenvolvimento sustentável.
por Maurício Palma Nogueira é engenheiro agrônomo, diretor da Athenagro e coordenador do Rally da Pecuária
Fonte da Notícia
Athenagro